"Criatividade consiste em ver o que todo mundo vê e pensar o que ninguém pensou"
Szent-Giorgyi - Prêmio Nobel de Química
Nos últimos 10 anos participei ativamente de atividades científicas, seja pesquisando, seja formando novos ortopedista, seja escrevendo, seja palestrando em congressos e jornadas. Fiz inúmeros amigos, conheci as diferentes realidades do país e levei experiência acumulada nos anos de pesquisa, estudo e em prática em Passo Fundo e Porto Alegre.
Mas afinal, qual foi a eficiência destes ensinamentos? Será que os meus colegas assistiram às palestras? Realizam hoje com eficiência a reparação de um manguito rotador ou tendão flexor, diagnosticam com clareza uma das múltiplas síndromes compressivas, indicam corretamente uma prótese ou sabem determinar e orientar a evolução da reabilitação?
A resposta certamente será um lacônico "não", ou um "mais ou menos". O país se transformou num imenso "congresso contínuo" de medicina onde o sucesso do evento é medido pelo número de participantes (geralmente mal acomodados) ou pela quantidade de "capas de livros" estrangeiros ou nacionais que palestram. Isto é um absurdo e uma deformação do ensino médico. Generalizando, dá pra dizer que "não tem mais ninguém para convidar".
Em recente congresso de dois dias havia quatro convidados estrangeiros de obscura projeção e de duvidosa qualidade científica. Isto ocorreu porque não havia ninguém mais para convidar naquela especialidade. Todos já haviam vindo ao Brasil!
Nesta sequência infindável de congressos apenas uma forma de ensino é praticada: slides, slides, slides... Na maioria das vezes sem qualquer discussão ou mesmo conclusão. a participação ativa da plateia (perguntas, troca de experiências ou críticas) nem pensar - não há tempo... O slide não sangra, não infecta, não mostra resultado final. Slide aceita tudo, especialmente agora com a introdução do discutível "Milionário Método multimídia" (MMM).
Em 1996 tivemos um congresso sem nenhuma atividade social - nenhuma empadinha servida, mas com lucro comprovado... e dois dias de slides das 8h às 18h! Os corredores destes congresso costumam estar cheios de stands que, pagando muito, tentam atrair a atenção dos congressistas das formas mais bizarras: sorteios, brindes, caricaturas, happy-hour, até pré-porno exposições... Dá para imaginar, sem qualquer esforço, como o médico é visto pelo departamento de marketing destas empresas.
Tenho a absoluta convicção de que os colegas que organizam congressos são verdadeiros heróis, já que despendem seus melhores horários e maiores esforços para a busca de patrocínio, organizando globalmente, "apagando incêndio entre estrelas", sempre para obter o melhor possível, já que o seu próprio nome e o da instituição estão em avaliação pelos sua pares.
O que estes colegas organizadores precisam entender é que existem múltiplas formas de educação médica continuada, além da mera "palestra". Num país onde a medicina está sendo torpedeada pelo chamado erro médico e onde a verdadeira educação médica continuada dá apenas os seu primeiros passos, vale a pena lembrar algumas "pérolas".
Em conclusão - slide é preciso, muito slide não é preciso.
(Jornal AMRIGS, abr. 97; Jornal da SBOT, jun. 97)